Polícia Civil do Ceará já possui mais de 70 inquéritos instaurados somente este ano; valores superam R$ 1
Na mesa do titular da DDF, um documento falsificado utilizava a
foto da deputada federal e ex-prefeita de São Paulo, Luiza Erundina
Foto: Rui Nóbrega
Francisca Iranice Alves de Souza Gomes, de 32 anos, estava em companhia da mãe, Ilva
Fotos: Kiko Silva
Titular da Delegacia de Defraudações e Falsificações (DDF), Jaime
de Paula Pessoa Linhares se mostrou preocupado com a maneira como os
empréstimos consignados são autorizados, deixando as vítimas expostas
Foto: Rui Nóbrega
Entidade diz que orienta usuários para evitar ataques criminosos contra dados bancários
Foto: Alex Costa
Na última semana, três mulheres foram presas, acusadas de utilizarem documentos fraudados e sacarem, indevidamente, empréstimos consignados em nome de aposentados e pensionistas, em Fortaleza. De acordo com a Polícia, houve o caso de uma das vítimas do golpe ter até cinco empréstimos não autorizados incluídos no nome.
Documentos falsos
Uma quadrilha cearense causou um prejuízo de cerca de R$ 350 mil em apenas seis meses a um correspondente bancário de Santa Catarina. No esquema, descoberto pela Delegacia de Defraudações e Falsificações (DDF), nomes de aposentados ou pensionistas do INSS eram usados indevidamente, com fotos de outras pessoas, em documentos fraudulentos. Em um dos que mais chamou a atenção da Polícia, que trazia o nome de uma aposentada cearense como solicitante, a imagem utilizada no documento fraudado para tentar a aprovação do crédito era a da deputada federal e ex-prefeita de São Paulo, Luiza Erundina.
De janeiro a junho deste ano, 56 contratos de empréstimo foram feitos pela quadrilha ao mesmo correspondente catarinense, de acordo com as investigações da DDF. Nestes, várias fotografias se repetem, em nomes diversos de vítimas que tiveram a documentação fraudada.
A advogada da empresa, Laís Amadeu, esteve em Fortaleza para acompanhar as investigações, e explicou como a empresa descobriu a ação do grupo. "Em janeiro, recebemos o contato de uma senhora que se identificou como Ana Paula. Ela nos enviou contratos com documentos autenticados, reconhecidos em cartório, cópia de cartões de benefício, em nome de supostos aposentados e pensionistas, solicitando empréstimo consignado. Em maio, descobrimos junto ao banco que iria liberar o dinheiro que todos os documentos enviados eram falsos, e que alguns usavam, inclusive, a mesma foto repetida várias vezes", disse.
Uma equipe da DDF, chefiada pelo inspetor Paulo Florentino, realizou na manhã da última terça-feira (27), a prisão de duas mulheres, mãe e filha, que tentavam sacar R$ 7 mil, utilizando documentos falsificados pela quadrilha de estelionatários.
As duas mulheres foram abordadas dentro de uma agência do banco Santander, na avenida Washington Soares. De acordo com o titular da DDF, delegado Jaime Paula Pessoa Linhares, há ainda muitos braços de uma rede organizada a serem descobertos. "As duas mulheres presas, mãe e filha, afirmaram que foram contatadas por uma pessoa há seis meses. A parte delas no esquema era somente sacar o dinheiro na boca do caixa. A mãe receberia R$ 400 e a filha, R$ 200 pela participação no crime. Elas confessaram tudo. Ainda estamos à procura dos responsáveis pela fraude na documentação", afirmou, enfatizando que as mulheres portavam identidade falsificada.
Foram capturadas, em flagrante, Ilva Alves de Souza, de 54 anos, acompanhada da filha Francisca Iranice Alves de Souza, de 32 anos.
Antes, na segunda-feira, uma outra mulher havia sido presa. Antônia Luciene Matias Rodrigues, de 55 anos, estava em uma agência bancária, na avenida Santos Dumont, na Aldeota, quando foi interceptada pela Polícia. Ela também iria receber a quantia de R$ 7 mil em nome de uma aposentada, utilizando documentação falsificada.
"A Antônia Luciene também confessou a participação no grupo criminoso, fazendo a retirada dos empréstimos nos bancos. Ela disse que já realizou quatro saques e que, pelo último, receberia R$ 1 mil. Ela foi presa com cartão de benefícios, 'cola' com as informações da vítima, comprovante de endereço e a cédula de crédito do correspondente bancário", informou o delegado titular da DDF.
Fragilidade do sistema é questionada por delegado
O delegado titular da Delegacia de Defraudações e Falsificações (DDF), Jaime Paula Pessoa Linhares, se mostrou bastante preocupado com a maneira como as negociações de empréstimo consignado são tratadas nas instituições financeiras.
O delegado não poupou críticas ao que chamou de 'sistema bancário frágil', diante dos inúmeros casos semelhantes do mesmo crime que investiga.
Na mesa do delegado, em 2014, já são cerca de 70 inquéritos policiais instaurados, somente sobre crimes de estelionato envolvendo empréstimos consignados irregulares de aposentados e pensionistas.
Em apenas um dos inquéritos - o que envolve a empresa catarinense - são 56 pedidos de empréstimo, o que geraria, no mínimo, segundo o delegado, 56 vítimas que tiveram os nomes usados de maneira indevida. Fora as pessoas cujas fotografias também foram utilizadas sem conhecimento nos documentos falsificados usados.
"O sistema é de uma fragilidade tamanha que permite ao fraudador usar de artifícios grosseiros, como a repetência das fotos nos documentos. Esse sistema expõe o pensionista, o aposentado, o pobre coitado que ganha pouco e vai ficar com o prejuízo", disparou.
Dificuldades
Jaime citou, ainda, as dificuldades que ele, enquanto autoridade policial, enfrenta para poder trabalhar, no sentido oposto às facilidades encontradas pelas quadrilhas criminosas.
O delegado ressaltou, por exemplo, que as quadrilhas dispõem de sites na internet, onde conseguem facilmente os dados das vítimas. Ele, porém, precisa de autorização superior para obter as mesmas informações.
"Para que eu possa ter os dados cadastrais de correntistas de bancos, preciso pedir autorização judicial, enfrentar uma maratona. Para o fraudador, está tudo na internet. Eu preciso fazer uma peregrinação enquanto o bandido está sempre à minha frente. Isso é absurdo. Se as mudanças no sistema bancário vieram para facilitar a vida do cidadão, facilitaram, na realidade, os trabalhos do fraudador", afirmou o delegado.
"Vamos identificar essas pessoas que tiveram os nomes usados, e vamos ouvir os bancos sobre os levantamentos cadastrais. Isso vai demandar alguns pedidos judiciais", emendou.
Febraban garante tentar coibir ações
Diante das críticas feitas pelo delegado titular da Delegacia de Defraudações e Falsificações (DDF) ao sistema bancário, e da recorrência dos crimes de estelionato envolvendo os nomes de aposentados e pensionistas em solicitações fraudulentas de empréstimos consignados, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) afirmou, em nota enviada à reportagem, que colabora com as investigações.
Além disso, a entidade, que é a principal representante do setor bancário nacional, reconheceu que 'falhas são passíveis de acontecer'.
"Fraudes na comercialização do consignado também prejudicam as instituições financeiras. A Federação colabora com autoridades policiais, com os PROCONs e outros órgãos de defesa do consumidor, como as Delegacias do Idoso, a fim de coibir eventuais irregularidades. Falhas são passíveis de acontecer". Disse a nota.
A entidade afirmou, também, que caso algum cliente ou usuário do sistema bancário encontre 'inexatidão em seus dados e cadastros', pode solicitar a imediata correção, citando o Código de Defesa do Consumidor (CDC).
A Febraran explica que em caso de 'serviços bancários ou cobranças que entenda incorretas', o cliente tem o prazo de resposta de até, no máximo, cinco dias desde a reclamação, que poderá ser feita a qualquer hora e a qualquer dia da semana, diretamente com a instituição financeira. Em caso de o banco não solucionar o problema, a própria Febraban poderá ser acionada através do site Conte Aqui (www.conteaqui.org.br).
Conscientização
De acordo com a entidade, campanhas de conscientização são desenvolvidas em parceria dos bancos com a Federação.
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